(des)ligando;

25.8.08

minha porta está trancada há exatos dois dias, quatro horas e dezenove segundos. sei disso pela programação da tv, acho que já vi todos os programas em cada um dos trinta e poucos canais. menos os de pornografia, que aí já é apelar demais. essas coisas se repetem, sabe como é? da terceira vez que você vê a maldita competição de quem imita melhor um peixe-boi ou sacaneia mais os vizinhos, você já sabe. e não tem graça.

aliás, a verdade é que nada tem muita graça mesmo. tv imita a vida real e a vida real imita a tv, tá todo mundo cansado de saber, minha gente. cadê novidade? no último capítulo todo mundo morre ou casa, depende da sorte do sujeito, né. e não tem essa história de mocinho ou bandido não, é sorte mesmo, sabe? ma-nique-ís-mo comigo não cola, cê ta me entendendo?

se essa baderna toda tivesse acontecido há uns vinte anos atrás, não seria assim. ah não! quando eu era jovem não deixava o tempo passar desse modo. tinha sempre o que fazer e o tempo, se quisesse, que corresse atrás de mim. mas quando você fica velho, faz o que? uns comprar cachorro gato papagaio garota de programa, outros vão morar com os filhos e cuidar da adorável prole melequenta. eu quero é que me deixem em paz.

trabalhei feito um cão a vida inteira, como dizem. não sei de onde tiraram que esse bicho preguiçso que só late e dorme trabalha, mas tudo bem. o fato é que dei duro minha vida toda pra sustentar mulher filho filha amante outra filha associação de moradores governador corrupto, agora mereço descansar em paz, antes que o diabo me carregue. porque deus deve ficar ocupado demais, provavelmente pensando: onde foi que eu errei?

pretensão ou não, às vezes também fico pensando nisso. onde foi que eu errei pra ficar velho num tempo em que bala perdida é mais comum que bala de hortelã? fora todos esses assaltos; até parece que vou dar meu dinheiro pra vigarista com idade pra ser meu neto! mesmo pra eles, só dou um trocado pra merenda da escola, porque preciso economizar pra viajar o mundo. velho tem esse direito.

porque sairde casa mesmo, só se for pra fora desse brasil e dessa cidade onde só acontece desastre & carnaval. já vi na tv todos os programas sobre grécia egito áfrica do sul, mas o meu favorito mesmo é o japão, porque tudo é ao contrário. lá o povo fica acordado enquanto a gente dorme e tem aquela parecida de olho puxado com um sorriso sacana, acho que é pra rir da gente. mas não é brincadeira não, a tecnologia toda vem de lá. pelo menos a minha tv. gosto do japonês porque ele trabalha sério.

já falei pros meus filhos que eles têm que trabalhar e parar com os telefonemas todosantodia. visitar mesmo, não visitam. ao invés disso, mandam uma televisão com canal até dizer chega. que seja, minha vista já tá mesmo muito cansada pra leitura e no jornal só tem tragédia. não vale nem a pena abrir a porta pra pegar, até porque hoje em dia ladrão vem até disfarçado de fascículo promocial sobre a história grega.

mas pra entrar aqui, só se for ladrão mesmo. de resto, só essas pessoas que aparecem na tv; jovens & belos. depois que a gente envelhece e não serve mais pra nada, ninguém liga, ninguém procura mais. ainda bem que logo menos junto dinheiro pra viajar o mundo todo, assim, sozinho mesmo. sem ninguém pra reclamar da bagunça fazer barulho dividir vinho e pôr-do-sol encantador. mas agora dá licença que tá na hora da minha novela.

signs that say what you want them to say and not signs that say what someone else wants you to say;

22.8.08

(gillian wearing)